Uma homenagem à minha bisavó
Está quase na hora. Falta-me tempo. Corro desesperadamente ao teu encontro, a toda velocidade. O tempo escasseia cada vez mais, mas não desisto. Não posso parar, nunca me vou perdoar se o fizer. Sei que estás a minha espera, não te posso desiludir. Hoje não. Apesar das forças começarem a faltar, não deixo que as minhas pernas me atrasem. O tempo é cada vez menos e o desespero começa a apoderar-se de mim. As ruas estão apinhadas de gente e tu não vais esperar por mim. Hoje não vais deixar, fui avisado disso mesmo. As lágrimas do meu rosto confundem-se com o suor de uma corrida que já dura há mais de meia hora. Consigo ver o imponente edifício, falta pouco para nos encontrarmos minha querida. Por favor espera por mim, peço-te. Não partas, espera só mais um pouco. Está quase! Nada me vai parar agora, estou demasiado perto. Só quero chegar a ti. Cada segundo estou mais próximo, já perdi a conta dos encontrões que dei sem querer às pessoas que passaram por mim da rua. Contudo, o que importa é que cheguei ao local onde estás, volto a correr freneticamente pelo labirinto de corredores que decorei por ti. Parecem todos iguais, mas já te visei tantas vezes que é impossível enganar-me. Não há tempo a perder! Estou cada vez mais próximo do bloco C30 . Algumas enfermeiras estão à porta, ouço ao longe um “chegou a tempo”. Não tenho tempo para responder. Ignoro. Entro na sala e vejo-te. Estás tão fraca bisavó. Agarro na tua mão. “Foste amada”, disse quase sem folgo. Vi-te a sorrir e, por fim, fechaste os olhos para sempre. O mundo acabou para ti, no entanto ainda caem lágrimas minhas pela tua mão.
[Ficção]